quarta-feira, 18 de março de 2020

Paradigmas


No dia 27 de fevereiro de 2020, o portal de notícias i44 publicou uma matéria sobre a rotina das crianças que mantém contato frequente com animais utilizados para um projeto educacional existente no colégio Conexão, situado em Campo Mourão/PR, cidade onde eu nasci e atualmente resido. 

O texto abaixo é uma reflexão que fiz e, resolvi expor através da escrita, sobre os fatos contidos em uma reportagem que pode ser acessada através deste link: https://i44.com.br/noticias/2020/02/27/em-escola-de-campo-mourao-animais-fazem-parte-da-educacao-das-criancas/.

Trechos retirados da matéria: "O contato com os animais desenvolve o cognitivo, ambiental, social e o emocional, afirmou a educadora.

{...} Gabriela disse que dois meninos conversavam após o almoço e um apressou o outro para tratar os bichos. Ele falou: ‘come logo, a gente precisa cuidar dos animais. Eles estão com fome’.

{...} O carinho e o apego aos bichos na mini fazenda são observados durante a atividade com a professora, no cuidado com a alimentação e demonstrações de afeto"

Ao ler essa matéria e assistir ao vídeo eu me encantei com o amor que essas crianças são capazes de demonstrar. No entanto, ao mesmo tempo, me pergunto se a alimentação dada nessa escolinha é totalmente vegetariana, visto que as crianças que cuidam dos animais estão sendo ensinadas a amá-los e a criar empatia por eles.

Pela matéria, percebe-se que a educadora também citou sobre o desenvolvimento cognitivo, emocional, ambiental e social que as crianças obtém pelo contato com os animais.

A partir daí me surge uma dúvida. Que tipo de paradigma está sendo criado na educação dessas crianças, se na escola é servido o cadáver proveniente das mesmas espécies de animais que elas amam e cuidam com o maior carinho, frequentemente?

O que está sendo ensinado seriam as diferentes formas que podemos explorar os animais apenas para benefício humano? Alguns para entretenimento e outros para o consumo de suas carnes de modo exacerbado?

Será que o menino que apressou o amiguinho para cuidar dos animais na hora do almoço estava se alimentando de um cadáver de outro animal inocente, sem necessidade? Estaria ele consciente disso?

No final, o que está sendo ensinado às crianças é como nós, animais humanos, podemos selecionar o restante dos animais para tipos variados de exploração em prol do nosso próprio benefício, afirmando através de nossas atitudes que a existência deles é destinada à servidão eterna?

Será que haverá um momento em que alguma dessas crianças vai perguntar a um adulto porque precisa comer animais, já que pela convivência criaram empatia por eles e, com a resposta obtida, caso consiga entender toda a hipocrisia por trás disso, ficará revoltada e desenvolverá sentimento de desesperança em relação à espécie humana?

Mesmo com todos esses questionamentos, entendo que o ato de comer  animais mortos até hoje é costume e um comportamento cultural praticado pelo ser humano, mas será que os pais desta geração assim como as instituições de ensino públicas e privadas não possuem condições para refletir sobre a hipocrisia prática que está sendo imposta à essas crianças?

Apesar disso, eu ainda apoio o contato direto das crianças com os animais através dessas escolinhas que ainda servem animais mortos no cardápio, pois se os pais dessas crianças e nem a instituição de ensino não consideram a empatia mais importante do que o prazer obtido pelos seus paladares, quem sabe as crianças desenvolvam essa empatia tão ausente nos dias atuais e comecem a questionar o motivo pelo qual necessitam comer quem eles amam e foram ensinados a respeitar (mesmo apenas quando lhes era conveniente)?

Conclusão: A esperança é de que, em alguns casos, o conhecimento do que é certo e justo seja obtido pela análise crítica de nós mesmos, através da observação das contradições humanas, desde o nascimento até a morte.

As nossas atitudes são e, sempre serão, uma responsabilidade individual com a nossa própria consciência, independentemente do que é apoiado e praticado pelos demais dentro de uma cultura dominante na sociedade.

Lembremos que, em épocas de escravidão e inexistência de direitos humanos, sempre existiram os que financiavam a prática da exploração de sua própria espécie, seja para trabalho ou para a satisfação de seus desejos sexuais, mas também existiam, apesar da escassez, pessoas que se recusavam a satisfazer seus desejos através da exploração de outras que eram consideradas inferiores.

Escravizamos os animais por afirmarmos que são irracionais e, portanto, inferiores.

Entretanto, apesar da racionalidade ser o fator principal para a distinção entre animais humanos e não humanos, ao mesmo tempo, é comum humanos utilizarem alguns de seus comportamentos instintivos que, evidentemente, estão mais ligados ao seu lado irracional, como argumento para não cessar a exploração dos animais não humanos.

Um dos maiores exemplos disso é o fato de nos permitir sermos escravizados por nosso próprio paladar, valendo-se de um de nossos sentidos como desculpa para continuar comendo os corpos dos animais.

Dessa forma, fundamentando nossas atitudes por meio de um comportamento relacionado ao nosso lado instintivo, que é o de obtermos prazer através do paladar, certamente nos deparamos estarmos mais próximo do nosso lado irracional do que o racional.

Qual o sentido de utilizarmos o mesmo argumento, que é o da irracionalidade, para inferiorizarmos os animais e, ao mesmo tempo, para negar a possibilidade de acabarmos com o sofrimento deles parando de explorá-los de formas até inimagináveis por alguns.

É motivo de orgulho à nossa espécie, sobrepor nossos prazeres obtidos com o paladar ao sofrimento que os demais animais passam para nos fornecer isso?

Nós humanos, nos auto-classificamos biologicamente como integrantes do reino animal, sendo assim, de alguma forma semelhantes ao restante dos animais.

Para honrar o título de racionais que nos auto-concebemos e fazer jus à lógica aristotélica que tanto admiramos, não devemos ser escravos de nenhum dos nossos cinco sentidos, mas vossos mentores.

Através dessa assimilação, simplesmente devemos sentir vergonha dessa hipocrisia e conviver com o medo que temos de conhecer a verdade buscando saber o que diariamente os animais passam em nossas mãos, ou agir para fazer justiça, saindo da nossa zona confortável e prestando muita atenção no que consumimos?

Ao conhecermos essa verdade, nosso sofrimento mental ativado pela empatia será maior do que o dos animais, mesmo tendo conhecimento de que estes têm seus corpos e sentimentos constantemente explorados sem quaisquer direitos, tratados como se fossem objetos que satisfazem os desejos econômicos e sexuais dos seres humanos?

De que lado do que se tornará história no futuro, queremos estar no presente?

terça-feira, 5 de agosto de 2014

Mágoas





Viva todos os minutos de prazer que tens agora, porque mesmo que mais tarde te arrependas, já nada nem ninguém te pode tirar o que viveste. A vida passa demasiado depressa, não se compadece com memórias nem remorsos.Vive-a com todas as tuas forças, aproveita o bom que ela te dá e apaga as mágoas.

Margarida Rebelo Pinto